O que internet mais barata e de melhor qualidade tem a ver com sustentabilidade? Mais do que pensamos à primeira vista.
O governo e as grandes empresas guardam consigo soluções para problemas que atingem a eles próprios, e insistem em ações simplórias, repetitivoas, sempre com base na lei no menor esforço.
Acabamos de ter a notícia que o Ministério da Fazenda vai novamente baixar a alíquota de carros para estimular sua venda. Não sei mais a eficácia de uma medida desse tipo. Quem já se endividou para comprar carro no ano passado vai fazer de novo? Tem tanta gente sem carro assim?
O estímulo em si não é uma medida ruim. Mas o governo pode escolher o que vai apoiar. Por que não apoiar, a exemplo de outros países, a produção de carros bem menores, de dois lugares, com motores muito econômicos e pouco poluentes, e com altas doses de inovação? De preferência com tecnologia criada no Brasil!
Estaríamos andando na direção certa em vários quesitos. Menos poluição, diminuição de engarrafamentos, pessoas trocando motos por carros (menos mortes) e estímulos a criadores e produtos brasileiros. Sem construir um centímetro de metrô, sem desapropriar uma casa. Isso porque nem falei carros elétricos. Lógico, isso atrapalharia a margem de lucro pornográfica das montadoras, e a Petrobrás não tem muito interesse em carros econômicos.
O problema é não enxergar além do próprio nariz, não ver conexões em pontos que parecem distantes, mas estão interligados.
Outro exemplo. As indústrias fonográficas e de entretenimento gastam fortunas tentando coibir a pirataria. A face mais visível e mais impactante dessa modalidade são as banquinhas de filmes e CDs que estão por todo o lugar na cidade. Sujam as ruas, ocupam espaço, agridem visualmente.
A solução mais utilizada é o uso da força policial, levando àquela famosa correria no centro da cidade, enfrentamentos constantes, e que no fim, não vale de nada. No dia seguinte as bancas estão todas lá.
A solução para esse problema está a milhas de lá, na casa de todo mundo, dentro das operadoras de telefone, que comandam a oferta do serviço (porco) de internet que o Brasil tem.
A pessoa que compra filmes piratas, faz por motivos bem simples. Oferta fácil e abundante, daquilo que ele quer ver, com lançamentos antes mesmo do que pelos meios oficiais. Preços bons (um DVD pirata é mais barato do que o aluguel do mesmo produto em uma locadora, e ele nem tem que devolver).
Se o cidadão tivesse uma internet barata e de boa qualidade, e com o estímulo correto, com certeza uma boa parcela trocaria a compra desses DVDs e CDs por assinaturas de serviços de locação online, que já não são muito caros, mas que, com escala, poderiam ser ainda mais baratos. Por que é mais pratico, mais limpo, e porque no fundo, todos querem fazer a coisa certa.
Mas o que temos é o contrário. Nossa internet, nosso 3G é um dos piores e mais caros do mundo. As agências reguladoras, que poderiam fazer a pressão pra mudar o cenário, são meros cabides de empregos. Por outro lado, para alguém adquirir um filme original, vai pagar os olhos da cara. A indústria fonográfica insiste em valores abusivos. E a experiência para o usuário é muito próxima da sua versão pirateada.
Ou seja, como no caso das drogas, enquanto houver demanda, vai haver oferta.
Aliás, o caso da internet poderia ajudar também em questões de mobilidade urbana e sustentabilidade. Com um serviço rápido e confiável, quantas pessoas poderiam trabalhar em sistema home-office, mesmo que em alguns dias da semana?
O que o design tem a ver com tudo isso?
Muito. Penso que essas soluções não aparecem porque o olhar daqueles que estão ocupando os cargos que decidem esses assuntos não é treinado para ver o que um designer vê.
A verdade é que as reuniões onde esse tipo de assunto é decidido são formadas por profissionais com visões muito similares. Não há vez para a voz dissonante, para as soluções diferentes.
As cúpulas administrativas das organizações ainda não dão vez para os criativos, especialmente aqui no Brasil. E elas próprias sofrem os efeitos dessa escolha. Companhias que abriram os olhos para essa realidade estão lucrando com isso. Não precisamos nem citar a Apple, que é o símbolo máximo dessa atitude.
Empresas como a Ideo são contratadas a peso de ouro para repensar produtos e processos, no chamado “Design Thinking”. O trabalho deles é sensacional. Mas para várias organizações, nem seria necessário. Afinal de contas, design é, no aspecto final, “projeto”. Ter um bom designer na mesa (e deixá-lo falar), durante uma reunião que não tem nada a ver com design, pode ter um resultado surpreendente, se sua empresa mantiver a cabeça aberta.
Mas aí, preciso ser sincero, seu sobrinho que mexe no Corel vai ajudar pouco.