Depois de ler a entrevista do Eric Karjaluoto, é impossível não ficar com uma pulga atrás da orelha. Sem ficar pensando até que ponto você é parte do problema, ou da solução.
Afinal de contas, designers são comunicadores. Damos corpo e voz às mensagens que nossos clientes gostariam de ver chegando corretamente aos seus clientes e colaboradores. Um designer pode até não concordar com a mensagem, mas vai entregá-la da melhor maneira possível, assim mesmo. Isso nos exime das intenções da empresa?
Na minha opinião, sim e não.
Não nos eximimos porque sempre podemos recusar um trabalho. Isso é mais fácil de dizer do que fazer. Além disso, poucos de nós efetivamente prestam serviços para vilões no quesito sustentabilidade. Poucos trabalham para mineradoras irresponsáveis ou poluidores compulsivos. A maioria dos designers enxerga valor em seus clientes, e sente que pode ajudá-los. É bem mais fácil dizer não a um fabricante de cigarro do que a uma empresa revendedora de peças de computador que te encomenda o serviço, apesar de você não ter ciência da maneira que nenhuma das duas trata o assunto em profundidade.
A necessidade acaba nos eximindo. Pelo menos durante um período de nossa vida, não estamos na posição de dizer alguns “nãos”. O que podemos, sim, é tentar aplicar técnicas, materiais e filosofias que impactem esse cliente na direção correta.
É aceitável dizer então que a grande transformação que poderá levar o mundo a uma guinada no sentido de práticas mais cuidadosas com o meio ambiente está pousada nas mãos das empresas, especialmente das grandes, que têm massa crítica e dinheira fazer alguma diferença no quadro.
As empresas, normalmente colocarão a culpa da inação na falta de estímulo dos governos, que poderiam liberar impostos, linhas de crédito e leis que tornassem mais fácil e lucrativo a implantação dessas políticas.
Mas falta uma variável nessa equação, e de fato, será ela que definirá o resultado. É o cliente do cliente. E esse tem um poder maior do que as outras partes.
Parece ingênuo falar disso numa época em que se compra formadores de opinião para ditar estilos de vida baseados principalmente em consumo. Mas o fato é que o poder silencioso dos consumidores já operou pequenos milagres no mercado.
O consumidor é a meta, que vai guiar todas as ações das empresas. As empresas farão virtualmente tudo o que for preciso para não perder os compradores de suas marcas.
Duvida?
O McDonalds verde, que circulou tanto pela internet tempos atrás, e que está se espalhando, especialmente pela Europa não é apenas uma jogada de marketing. É uma reação inteligente a uma campanha negativa que começou após o documentário “Supersize Me”, de 2004. O filme pintava a rede de lanchonete como um dos agentes malignos que estavam transformando a sociedade americana numa nação de obesos mórbidos e diabético, pelo uso indiscriminado de comida gordurosa, mal feita e barata.
A resposta veio na contratação de um chef famoso, tirado do Four Seasons. Dan Coudreaut vem reformulando o cardápio do McDonalds, dando cores mais saudáveis ao menu. Isso acabou impactando até no conceito visual das lojas, ao invés do vermelho e amarelo estourados, as lojas tem um apelo muito mais refinado hoje em dia, inclusive aqui no Brasil. Eu mesmo comi num Mac de shopping center em São Paulo, cuja fachada substituiu o vermelho de fundo por um sofisticado preto.
A rede de hipermercados Walmart, depois de sofrer algumas acusações de dizimar os pequenos produtores e vender alimentos baratos, porém sem qualidade, começou a valorizar produtores locais, comprar vegetais orgânicos e mesmo a adquirir marcas de produtos com conceitos sustentáveis.
Recentemente, a rede fechou uma parceria pra lá de ambiciosa (pra não dizer compra, mesmo) com a produtora de orgânicos Yogurtes Stony Field. Gary Hirshberg, um ex-hippie se manteve no comando da marca, como diretor, presidente e C.E.O. (que eles, com ótimo senso de humor, denominam CE-Yo). Segundo Hirshberg, o Walmart agora exige critérios muito rígidos de seus fornecedores. E que o Walmart sempre foi conhecido pela capacidade de se reinventar.
Certa vez, durante um evento que a empresa em que eu trabalhava promovou, tive a oportunidade de almoçar com o brilhante Bruce Mau (quem não conhece está desde já cometendo um pecado). Ele me contou que uma empresa de carpetes Canadense vinha fazendo muito sucesso ao introduzir uma linha de produtos sustentável, baseada num modelo de negócios diferente. A empresa, hoje muito conhecida dos ambientalistas, era a Interface. Mau foi consultado pela concorrente dessa empresa, a Shaw.
Bruce Mau é muito conhecido por seu incrivel trabalho na área de sustentabilidade. Na verdade, a Shaw sempre foi muito maior que a Interface. Mas todo o discurso do concorrente vinha fazendo mal a sua imagem. Decidiram que queriam uma linha ecológica, mesmo que não desse lucro, apenas para se posicionar bem no mercado. Bruce Mau aceitou o desafio, com uma condição. Que trabalhassem para que desse, sim, lucro.
Criou uma linha de carpetes feitos com materiais menos agressivos, que ao invés de virem em rolos, vinham em placas quadradas. Atrás de cada placa, um número de telefone e um código. Quando alguma placa era danificada, era só discar o número do telefone, passar o código, e a empresa se encarregava de repor a peça, levar a danificada, e cuidar do seu descarte de maneira correta.
Em pouco tempo se tornou a linha mais rentável da Shaw.
Como se vê, uma vez que os clientes realmente demandem, as empresas correrão atrás de satisfazê-los. Em 100% dos casos. Isso será verdade inclusive em casos cabeludos, como na susbsitituição de combustíveis fósseis e na destinação de lixo. Se o mercado pedir, as empresas atenderão.
O caso é que para isso acontecer, precisa entrar na nossa conta o ativo mais valioso, porém o mais escasso, não somente aqui, mas em vários lugares do mundo. Educação.
Alguém que pensa, raciocina, faz analogias inteligentes não consome qualquer coisa. Não dá qualquer coisa para seus filhos comerem. Não aceita qualquer mensagem que lhe direcionarem.
Mas aí, o buraco é muito mais embaixo. Enquanto puderem evitar esse choque de educação, mais lucro fácil terão as empresas, os governos e as igrejas.
E isso é caso para um outro post.